NO PRINCÍPIO ERA A MÃE – 16/10/2012

RESUMO
Dialoga sobre o controle que o homem tem sobre a natureza, o poder que o homem tem sobre a mulher. Aborda a visão da maternidade como uma grande força sagrada. Apresenta o mundo governado pelas mulheres, todavia a noção de matriarcado nada mais é do que uma projeção masculina sobre uma estrutura feminina de poder. Infere como a mulher fica reduzida ao âmbito do privado, fornecendo o maior número de filhos para arar a terra e defender a terra e o Estado. Assevera a demasiada competição, pelas mulheres, pelos excedentes e pela propriedade foi aos poucos originando a supremacia masculina e uma cultura competitiva. Reflete acerca da origem do patriarcado.

Palavras-chave: mulher, maternidade, sociedade, competição, patriarcado.

Muraro (2000, p. 61) assevera:

No princípio era a mãe. O Verbo veio muito tempo depois e iniciou uma nova era: o patriarcado. O Verbo, a Palavra, um símbolo abstrato, uma entidade arbitrária, pode dar vida a qualquer realidade, por mais imaginária e inexistente que seja. E a palavra pode até distorcer o sentido das realidades físicas mais óbvias, tais como o fato de a mãe dar à luz a criança e amamentá-la, e inaugurar a dominação do macho, através da fabricação de papéis. Os machos não são dominadores por natureza, da mesma maneira biológica que as fêmeas dão à luz. E é a Palavra, o patriarcado que quer fazer da dominação masculina um fato “natural” e biológico. E o patriarcado é de tal modo hoje uma realidade bem sucedida que muitos não conseguem pensar na organização da vida humana de maneira diferente da patriarcal, em que o macho domina de direito e de fato.

A maternidade pode ser vista como uma grande força sagrada, segundo Borges (1998), como nas culturas ancestrais, ou como vulnerabilidade, inferioridade, como na cultura ocidental moderna. Assim, o homem é percebido ou como um elemento marginal nas culturas matricêntricas ou como um macho dominador das culturas agrárias mais recentes.

A partir do século XIX muitos pensadores, tais quais, Bachofen, Driffault, entre tantos, apresentavam o mundo governado pelas mulheres, todavia a noção de matriarcado nada mais é do que uma projeção masculina sobre uma estrutura feminina de poder.

Max e Engels, importantes pensadores do século XIX, analisaram tal tema e afirmavam que a divisão sexual do trabalho originava a divisão social do trabalho, encaminhando para a especialização, que por sua vez levou ao aperfeiçoamento de tecnologia que deram origem aos excedentes, ou seja, aos lucros.

Tais excedentes poderiam ser utilizados como valores de troca, originando uma classe dominante que não precisava trabalhar, vivia da venda dos excedentes, escravizando boa parte da população. Surge daí o Estado centralizador, autoritário e violento.

Nessa época, o sexo feminino, Muraro (2000), é também dominado e a mulher fica reduzida ao âmbito do privado, fornecendo o maior número de filhos para arar a terra e defender a terra e o Estado.

A competição, pelas mulheres, pelos excedentes e pela propriedade foi aos poucos originando a supremacia masculina e uma cultura competitiva. O patriarcado teve uma origem gradual e lenta. Os homens puderam abrir um grau de distanciamento entre os humanos e o meio ambiente. Distância e separação que origina hostilidade, estranhamento, portanto inicia uma incipiente inimizade entre o homem e a natureza. Assim, rompia a harmonia entre os homens e a natureza.

De acordo com Muraro (2000, p. 65):

[...] Nesse instante, o macho pode assumir o controle da sexualidade das mulheres e, portanto, o poder sobre elas e a natureza. Do conceito abstrato de controle vem o conceito da superioridade-transcendência do homem sobre a natureza e a mulher. Nascem mitos e crenças sobre um deus todo poderoso e transcendente, e, não mais imanente, como nas sociedades matrilineares. A grande mãe imanente é substituída pelo deus transcendente e controlador.. A mulher fica mergulhada no reino da natureza, enquanto o homem aloca a si mesmo o da cultura. E como se acreditou, durante milênios, que as mulheres tinham uma relação especial com o sagrado que emanava da natureza, agora as novas religiões passavam a dirigir-se mais aos homens. A eles o domínio do sagrado, a centralidade do poder; às mulheres, a marginalidade nos cultos e no âmbito do poder e do público.

Conforme Miler (1988), as sociedades patriarcais temiam as mulheres devido a tabus referentes à menstruação, ao parto e a nudez. Sendo assim, tais sociedades controlam a reprodução e o trabalho das mulheres.

No que concerne à relação homem-mulher, ela se transforma a partir das sociedades de caça. A inveja primitiva que o homem tinha da procriação (inveja do útero) é exorcizada pela iniciação dos rapazes. Os mesmos são afastados de suas mães na puberdade e renascem de maneira ritual para o mundo masculino. O homem assume para si parte do processo reprodutivo no rito couvade; em que o macho logo após o nascimento da criança, assume o lugar da mãe, recebendo visitas enquanto ela vai trabalhar nos campos.

Os tabus pertinentes à menstruação permeiam, no patriarcado, desde as sociedades mais simples até as mais complexas. Antes, a terra era regada com o fluxo menstrual, como augúrio de fecundidade, agora a menstruação é punida Muraro (2000).

Entre os papuas da Nova Guiné, qualquer objeto tocado por uma mulher menstruada pode quebrar nas mãos de um homem; uma pedra pode voltar-se contra aquele que a segura. A vagina ou qualquer objeto que se pareça com ela é temido.

Os papagos, índios do sudeste norte-americanos, temem o poder que julgam emanar da menstruação; um homem que toca uma mulher menstruada não pode participar de batalhas.

Muraro (2000, p. 67) reflete:

O sentido destes tabus é mostrado de maneira muito clara entre os esquimós, os seres humanos que vivem no mais difícil ambiente deste planeta. Eles vêem uma necessidade específica de o homem adquirir a sua identidade e conquistar o poder com grande esforço, pois a mulher já tem naturalmente a sua e o seu poder flui de maneira simples através da gravidez e do parto. As mulheres são associadas com a vida e a fertilidade, os homens com a morte e a esterilidade. Por isso, essas culturas têm uma forte tendência à migração e à conquista para exorcizar este poder feminino.

Nas culturas patriarcais, as mulheres são associadas à sedução, à traição e induz o homem a caminhos que conduzem à derrota e à morte.

Segundo Medina (1974), o medo da força genesíaca da mulher fez com que fosse construído no decorrer dos séculos e milênios uma identidade masculina alicerçada na capacidade intelectual dos machos em relação à mulher controlando assim a natureza e inventando novas tecnologias para prover alimentos e defesa para os grupos e vencendo as guerras. O domínio público, da história, foi dado ao princípio masculino, enquanto o princípio feminino foi marginalizado, circunscrito ao domínio da casa, do privado, da reprodução.

Ao contrário das culturas matricêntricas, que vai para a c asa do consorte é a mulher. Arrancada de sua família, para entrar numa família desconhecida, servindo a sogra dominadora, cunhadas hostis, como acontecia na China, no Japão e no mundo Árabe.

Com a dominação econômica exercida sobre a mulher pelo marido e sua família, a mulher introjeta a sua inferioridade. Tal inferioridade se traduz em dependência psicológica em relação ao homem, em tendências masoquistas, narcisismo ferido, frigidez e carência sexual, tais tendências são compensadas afetivamente nas relações com os filhos, principalmente os filhos homens. Ficam impossibilitadas alianças entre as mulheres, uma vez que existem competições pelos casamentos mais ricos. Enquanto isso os homens fazem alianças, vivem em grupos solidários, reforçando assim sua superioridade construída sobre a divisão das mulheres Friedl (1975).

Muraro (2000), dialoga sobre o controle que o homem tem sobre a natureza, o poder que o homem tem sobre a mulher. O fruto da árvore do conhecimento afasta o homem da natureza, e a árvore do conhecimento é também a árvore do bem e do mal. Do bem, no que tange à continuidade do processo humano, e do mal no sentido em que se cria o poder, a dominação como se conhece hoje.

Profª. Drª. Anna Cecília Teixeira
Diretora do Colégio Americano Vitória.
Gestora Pedagógica do Americano Sistema de Ensino do ES.
Profª. Da Rede Doctum de Ensino